Pode aprender-se a ser um melhor líder com toda a gente. Pode estudar-se uma orquestra. Pode estudar-se uma equipa de basquetebol, um negócio, o que quer que seja ."
Mike Krzewski, coach da equipa olímpica de basquetebol dos EUA
Equipas Desportivas: 1-X-2
O desporto oferece um terreno propício para o estudo do funcionamento das equipas e das organizações, por diversas razões:
1. Muitos desportos são de equipa. Logo, exigem capacidades de trabalho em equipa.
2. As equipas desportivas expõem, de forma rápida, processos que noutros contextos são mais difíceis de observar. Por exemplo, o papel do líder emerge mais facilmente como bode expiatório. Este processo poderá ser semelhante nas empresas, mas no desporto ocorre em regime de alta velocidade: uma sequência de derrotas num curto espaço de tempo pode ser suficiente para desqualificar um treinador. Contrariamente, nas empresas podem ser necessários vários trimestres - e na vida política vários anos ou ciclos eleitorais.
3. Os membros da equipa recebem feedback de forma explícita e regular. Não precisam de esperar por avaliações de desempenho anuais. As métricas de desempenho são muito simples e claras: 1-X-2. Isso clarifica as relações de causa-efeito.
4. A componente emocional da atividade é, frequentemente, saliente. O desporto é uma fonte de identificação, de catarse, de emoção. Um adepto desportivo, tal como o membro de uma equipa, pode expressar emoções de forma extrema: gritar, dançar, praguejar e gesticular.
5. No desporto, deseja-se que os participantes "vistam a camisola". Isto é, que se identifiquem incondicionalmente com a organização.
Casos: FC Barcelona, Sporting dos Cinco Violinos, Chicago Bulls de Phill Jackson, Seleção Portuguesa de 2004 e All Blacks
· Algumas destas equipas têm ligações fortes com alguma entidade externa que as enquadra e lhes dá sentido. Esta ligação era visível nas bandeiras espalhadas por Portugal durante o Euro 2004, ou na identidade do Barcelona como més que un club, uma bandeira da Catalunha. Os Springbooks de 1995, retratados no filme Invictus, foram o símbolo emblemático de uma nova República da África do Sul.
· As melhores equipas têm um estilo, uma idiossincrasia - quer se trate das harmonias do Quinteto dos Violinos Sportinguistas, quer seja o Tiki Taka, o futebol rendilhado do Barcelona de Pep Guardiola.
· As boas equipas têm escola. O futebol total do Barcelona vem do tempo de Cruyff, o lendário ex-jogador e treinador holandês do emblema catalão. O estilo é cultivado na escola de La Masia. Jesus Correia, um dos violinos sportinguistas terá sido, porventura, o primeiro de uma escola de grandes avançados extremos - uma linhagem que continuou com jogadores como Futre, Simão, Figo, Quaresma e Cristiano Ronaldo.
· As equipas de alto desempenho contêm, paradoxalmente, desejo de mudança e vontade de continuidade. Os Chicago Bulls de Phil Jackson tiveram duas séries vitoriosas. Dois jogadores estiveram em ambas as séries, assegurando a evolução na continuidade.
· Nas boas equipas, coexistem vários capitães. Mano Menezes, treinador da seleção brasileira de futebol, explicou o ponto: "Um grupo precisa de muitos líderes. Envergar a braçadeira é meramente simbólico, no sentido em que a liderança deve ser exercida em campo por vários jogadores do grupo, que pela sua técnica assumirão esse papel (porque a liderança também é técnica em determinados momentos)".
Equipas na Música: a diferença que faz a diferença
A música tem sido uma fonte de inspiração para a compreensão do funcionamento organizacional: "O funcionamento de uma big band ou de uma small band levanta desafios de participação, interatividade e coordenação que surgem tipicamente no desenvolvimento regular de uma economia de mercado", explicou António Pinto Barbosa, professor de economia na Nova SBE e músico dos Lisbon Swingers. Em alguns casos, a música tem sido usada como metáfora, quer se trate da visão da organização como orquestra sinfónica ou como combo de jazz, quer da análise do estilo de atuação de líderes como Miles Davis ou o maestro Claudio Abbado - descritos, respetivamente, como o "catalisador de inovações" e o "facilitador supremo".
Como explicou o músico Tiago Bettencourt: "Tem de haver sempre um líder numa banda para um concerto ter ritmo e coerência. Por outro lado, temos sempre os nossos momentos de improvisação, onde não há propriamente nenhum líder e confiamos no instinto uns dos outros para levar a música a sítios que não planeámos." Por isso, a liderança musical é uma cornucópia para o estudo da liderança organizacional.
Casos: Smiths, Beatles, Queen, Xutos & Pontapés e U2
· A liderança musical é um processo partilhado, coletivo. Sem essa liderança não há uma banda, mas um bando.
· A gestão pode inspirar-se no jazz para aprender sobre a importância de estruturas mínimas e heurísticas.
· A individualidade e a diferença são uma fonte de criatividade. Ambas devem ser respeitadas. Uma boa banda é um veículo para a expressão individual, não um obstáculo.
· Muito trabalho de equipa é preparado nos "bastidores". Um bom músico toca com os outros, mas também pratica individualmente para se destacar a si próprio, e à banda.
· Numa boa equipa, todos fazem solos e todos apoiam, criam contexto.
· Uma boa equipa é aquela cujos membros não param de se escutar mutuamente. Isto faz tanto sentido na música, como nas organizações.
· Uma boa equipa é aquela que arrisca e busca a diferença. A diferença faz a diferença.
· Alguns grupos swingam; outros não.
Forças de elite: dos fracos não reza a história
Jon Katzenbach, autor de The Wisdom of Teams, considera que as unidades militares de elite são excelentes lugares para encontrar verdadeiras equipas. A existência de uma hierarquia clara não é um obstáculo à emergência de líderes quando estes são necessários para tarefas específicas.
A decisão de estudar equipas em contexto militar baseou-se numa observação simples: as Forças Armadas são vulgarmente apresentadas como organizações hierárquicas, mecanicistas e rígidas, mas esta metáfora nem sempre é uma descrição justa da realidade. Certas unidades das Forças Armadas e de segurança operam em teatros de enorme risco e imprevisibilidade, circunstâncias que invalidam a abordagem mecanicista e requerem organicismo, improvisação e até "desrespeito" pela hierarquia. A necessidade dos líderes militares desenvolverem competências relacionais é equivalente (ou até superior) à necessária noutras organizações.
A escolha óbvia para aprender com equipas militares que não operam de acordo com a metáfora tradicional recai sobre as forças ditas especiais. Também estas estruturas requerem mais, e não menos, empoderamento. Ou seja, as equipas militares podem ser uma fonte de aprendizagem para outros contextos organizacionais.
Casos: BOPE, GOE, Hashishin, Guerreiros Jaguar e Legião Estrangeira
· A sensação de fazer parte de um corpo de elite ajuda a cimentar o orgulho na equipa e na organização.
· Um treino duro gera espírito de corpo. Não é com "paninhos quentes" que se adquire resiliência coletiva. E é esta que pode permitir à equipa e à organização transformar o veneno em remédio.
· Um sentimento de pertença a algo mais vasto infunde significado (os Guerreiros Jaguar do Império Asteca eram ungidos pelo chefe militar supremo Tlatoani).
· O desejo de superação é necessário. No caso do BOPE, o "cemitério dos aspiras" simboliza a necessidade dos que falharam a entrada naquela "tropa de elite" de voltarem a tentar.
· A confiança nos camaradas é crítica: o treino de tiro face-a-face no GOE é tanto um exercício de perícia como de confiança.
Resumindo e concluindo
Procurámos entender melhor as equipas de sucesso considerando três domínios: o desporto, a música e as forças militares de elite. Articular os campos parece fazer sentido, porque equipas num domínio inspiram-se, por vezes, em equipas noutros domínios. Partindo desta discussão, é importante extrapolar os ensinamentos de cada um destes casos para o contexto organizacional, para as nossas equipas.
Esta publicação baseia-se no Applied Knowledge " Superequipas: quando o todo é muito superior à soma das partes" de Miguel Pina e Cunha, Nadim Habib, Arménio Rego, António Abrantes, Pedro Almeida, Miguel Faro Viana, Patrícia Palma e Paula Lourenço Afonso, em colaboração com os participantes do Advanced Management Program da MSD.