setor financeiro atravessa um período de mudança estrutural profunda, marcado pelo impacto da tecnologia, pelo reforço das práticas sustentáveis e por alterações nos enquadramentos regulatórios e institucionais. A digitalização de processos, a proliferação de fintechs, o desenvolvimento de ativos digitais e o avanço da inteligência artificial têm vindo a redesenhar os modelos de negócio, mecanismos de avaliação de risco e as relações entre os diferentes agentes económicos. Neste contexto de mudanças aceleradas, é comum assumir que o “céu é o limite”, como se o progresso seguisse naturalmente uma trajetória linear e sem obstáculos.
No entanto, entre os múltiplos fatores que moldam esta nova realidade, há um que permanece frequentemente subestimado — apesar da sua importância estratégica: o papel das transformações políticas. A política não é apenas um pano de fundo para a reconfiguração do setor financeiro: é uma força ativa que condiciona e orienta a sua evolução. O ritmo e o rumo da inovação financeira dependerão, em larga medida, de escolhas políticas que definem os enquadramentos institucionais, fiscais, regulatórios e tecnológicos nos quais essa inovação se desenvolve.
O atual contexto político introduz níveis de incerteza que desafiam os modelos tradicionais de análise e decisão. A crescente fragmentação partidária, a evolução dos discursos políticos, a reconfiguração das alianças geopolítica se o aumento da polarização em várias democracias estão a enfraquecer os padrões habituais de previsibilidade institucional. Estas dinâmicas afetam diretamente o setor financeiro - não apenas através de políticas económicas concretas, mas também pela dificuldade crescente em antecipar as decisões dos agentes públicos.
A relação histórica entre o setor financeiro e a política — visível em políticas fiscais, orientações monetárias e regimes de supervisão — tornou-se ainda mais relevante perante os atuais avanços tecnológicos. Tecnologias como a inteligência artificial, o blockchain e as moedas digitais emitidas pelos bancos centrais estão sujeitas a escolhas políticas que podem acelerar ou travar a inovação. Por exemplo, a forma como as fintechs são regulamentadas pode determinar a competitividade e a resiliência de todo o ecossistema financeiro.
Para além da inovação tecnológica, outras dimensões estruturais do setor financeiro são igualmente condicionadas por transformações políticas. A estabilidade institucional continua a ser uma base fundamental para a confiança dos investidores e um fator moderador da volatilidade dos mercados. Decisões sobre a governação dos bancos centrais ou sobre a introdução de moedas digitais públicas envolvem escolhas políticas com impactos sistémicos profundos.
Também no domínio da sustentabilidade, as políticas públicas assumem um papel estruturante. A integração de critérios ambientais, sociais e de governação (ESG) nos mercados financeiros depende, em grande parte, das prioridades definidas pelos governos na transição para uma economia verde e do alinhamento dos instrumentos regulatórios. Políticas ambiciosas podem acelerara consolidação de produtos financeiros sustentáveis e fomentar práticas ESG.Pelo contrário, a ausência de regulamentação clara ou de incentivos eficazes pode dificultar – ou mesmo reverter - essa transição.
Neste contexto de interligação entre inovação tecnológica, desafios ambientais e transformação política, liderar no setor financeiro exige mais do que competências técnicas ou domínio tecnológico. Requer a capacidade de antecipar ciclos políticos, compreender prioridades legislativas e incorporar variáveis de governação na formulação estratégica. A inovação mantém-se essencial, mas a aptidão para interpretar a complexidade das dinâmicas políticas tornou-se um ativo decisivo para quem pretende moldar o futuro do setor financeiro.