Há muito que o professor Miguel Pina e Cunha estuda organizações positivas. Porquê? “Porque existe um número infinito de empresas tão más que precisamos de conhecer uma alternativa”, começou por explicar numa palestra sobre o tema. Nestas organizações, muitas vezes, não é possível confiar nos colegas ou nos chefes, dizer a verdade não é uma opção, e as relações criadas não são de apoio. Pelo contrário, são minadas pela competição constante. “As empresas tornam-se ringues políticos, de uma forma negativa”.

Nestas organizações, a vida laboral é dolorosa. Aliás, o Professor Catedrático da Nova SBE sublinhou que “trabalho” deriva etimologicamente da palavra latina tripalium, que significa três paus, sendo o nome dado a um objeto de tortura usado na Roma Antiga. “E, para muitas pessoas, trabalhar é mesmo uma verdadeira tortura diária, das 9 às 5”, acrescentou.

Devemos investir em organizações mais positivas simplesmente porque passamos muito tempo nos nossos empregos e é importante criar locais onde o trabalho tenha significado, permitindo-nos estar rodeados de boas pessoas”. Para tal, devemos primeiro compreender que a vida laboral é, em si, um paradoxo: “o que torna as organizações positivas não é a eliminação do negativo, mas a capacidade de balançar eventos positivos e negativos por forma a que um resultado seja criado. Por outras palavras, positividade não é a ausência de negatividade, mas a capacidade de crescer com coisas boas e más”. A questão é: como podemos usar estes dois polos para evoluir profissionalmente?

Eu começaria com o significado de trabalho. O que é para mim? O mesmo cargo pode ser percecionado de forma diferente por diferentes pessoas – pode ser visto como um emprego, uma carreira ou um chamamento”. Na perspetiva de um emprego, o trabalho não é mais do que uma combinação de tarefas necessárias para ganhar dinheiro. Já se o virmos como uma carreira, pressupõe-se que é um meio para atingir um fim, um caminho que envolve mais responsabilidade, crescimento, que vai para além das tarefas desempenhadas. Por último, pode ser interpretado como um chamamento, algo que tem a ver com um significado e um propósito.

No que diz respeito a esta última dimensão, Miguel Pina e Cunha explica que é possível considerar o propósito de uma forma inata, se considerarmos que nascemos para desempenhar uma tarefa, ou de uma forma apreendida, não sentindo que este chamamento é inerente à nossa personalidade, mas que, ao desempenhar determinado trabalho, “conseguimos criar impacto e aprendemos a gostar disso”. “E eu suponho que maior parte das pessoas encontre sentido no seu trabalho não porque nasceu para tal, mas porque aprendeu a gostar do que faz. A boa notícia é que penso que é possível encontrar um propósito em qualquer tipo de trabalho”.

Ao analisarmos o exemplo acima apresentado, percebemos que o propósito parte, muitas vezes, de uma escolha. Da mesma forma, podemos escolher tornar um ambiente de trabalho mais tóxico ou positivo, dependendo das nossas opções diárias. Assim sendo, devemos questionar-nos: como posso crescer e ajudar outras pessoas a crescerem no local de trabalho?

Penso que uma das formas mais eficazes de aplicar estes princípios consiste em abraçar o conceito de mentalidade de crescimento (growth mindset), descrito por Carol Dwek”, explicou. Olhemos, por exemplo para a inteligência, podemos pensá-la como algo fixo ou que se pode treinar. Se optarmos pela primeira opção, vamos ajudar as pessoas a crescerem menos, porque acreditamos que nada do que façamos terá impacto no resultado. Se assumirmos que é algo que pode ser moldado, temos de aceitar o risco de poder falhar nesta tarefa, mas será sempre algo que terá maior impacto e trará, consequentemente, maior felicidade.

Carol Dwek fez uma experiência com várias crianças que ensinou a construírem puzzles entre 100 até 300 peças. Depois, questionou-as sobre que tipo de puzzle gostariam de continuar a fazer – o mais simples, de 100, ou um mais complexo, com mais de 300. Vários participantes escolheram a primeira opção, por ser mais fácil e uma escolha mais segura, contudo, houve crianças que optaram pelo puzzle mais complicado, perguntando: “qual é a piada de fazer algo que já sabemos fazer?”. Concluímos com este exemplo que, para alcançar algo divertido e que nos realize no local de trabalho, é necessário arriscar, aceitando a possibilidade da falha. E mais: no início, ninguém é competente numa tarefa que nunca fez. Possivelmente, vai falhar muitas vezes.

Mais uma vez percebemos que “a positividade é paradoxal: não existe crescimento sem sofrimento”. Se quisermos arriscar fazer uma nova tarefa, provavelmente vamos errar.

Como podemos apoiar-nos mutuamente neste processo? Cultivando algo chamado segurança psicológica, apoiando alguém que falhe, para que possa aprender algo. Se virmos o erro como uma oportunidade para aprender, então deixa de ser uma falha. Não estou a dizer que a falha é boa, porque ninguém gosta de falhar, mas, por outro lado, evitar a falha resulta numa de duas coisas: ou se faz sempre o mesmo ou nunca se faz nada. A alternativa é experimentar coisas novas, melhorar, mas, possivelmente, vamos falhar”. Do lado dos que apoiam, a segurança psicológica consegue-se ao reforçar positivamente com afirmações como: “resolve o problema, porque eu sei que nunca mais vais voltar a fazer este erro”.

No final do dia, é uma escolha nossa a forma como vamos proceder. No entanto, é bom manter na memória que o interessante nestas organizações positivas é que esta segurança psicológica não surge só nos momentos importantes, parte de todas as interações do dia a dia. “As boas organizações são aquelas que agem como um só: onde as pessoas vencem juntas e perdem juntas”.

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Publicado em 
29/3/2021
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