Durante dois anos vivemos um período conturbado, com dois confinamentos, em que as rotinas diárias do mundo laboral foram completamente rompidas. Estamos a falar, especialmente, de momentos em equipa, como os almoços no refeitório ou as reuniões presenciais. Nessa altura, ficámos “só” com o trabalho, fechados em casa. A estas condições desafiantes, somou-se, em muitos casos, uma crise de propósito, porque muitos de nós considerámos difícil continuar no mesmo emprego apenas pelas tarefas.
Numa altura em que os níveis de satisfação com o trabalho se afundaram, as empresas viram-se a braços com problemas de motivação e retenção de colaboradores, assim como dificuldades em atrair novos talentos.
O que fazer numa situação destas? Na minha opinião, é necessário apostar em líderes e lideranças que saibam motivar e criar uma noção de “valor” nos colaboradores, mesmo gerindo à distância. Para tal, é necessário ter muito clara a diferença entre líder e gestor, porque as duas palavras podem referir-se à mesma função, mas têm significados completamente distintos. Quando se fala em gestão, há uma tendência para nos focarmos em objetivos, métricas, KPIs e desempenho, muito numa lógica de presente. Mas, se referimos a palavra liderança, pressupõe-se planeamento, potencial, mudança e um foco a médio-longo prazo.
Implica também que se fale de uma gestão que vá além da distância do toque, o que significa, nas entrelinhas, delegar e confiar. O chefe deve saber quando os colaboradores estão a trabalhar, sem que tenha de controlar todos os seus movimentos, de saber apoiar-se na equipa para encontrar a solução, ouvir, discutir, negociar e conhecer “as suas pessoas”, sabendo o que é único em cada colaborador, conhecendo o seu potencial e aspirações e, acima de qualquer outra coisa, colocando mais humanidade na gestão.
Pode perguntar-se como um líder consegue atingir este nível de confiança. Através de algo que parece muito simples, mas que, na realidade, é extremamente desafiante no local de trabalho: mostrar vulnerabilidade e trocar experiências com a sua equipa.
Este seria o papel do líder ideal, que já existe em algumas organizações, mas seguramente este não é o perfil mais comumente encontrado nas chefias. Em grande parte das empresas, diria que atualmente se vive e atua em constante “emergência”, com prazos apertados, e com “gestores” que sobrevalorizam o presente, ao invés de apostarem no futuro. Isto implica que, frequentemente, acabam por premiar processos nefastos para os trabalhadores, porque alcançam resultados a curto prazo, mas que ao longo do tempo resultam em burnout, quebra dos níveis de confiança e motivação, apatia e desmantelamento de equipas.
Há muitos gestores (provavelmente até a maior parte) que gostariam de fazer esta transição, mas sentem que “não têm tempo para o fazer” ou “chefias que o permitam”, porque existe uma confusão enorme entre processos e resultados. Mas, só por expressarem essa vontade de mudar, significa que estão abertos para tentar novos processos. E muitas vezes basta apenas criar uma cultura de partilha, assente em conversas frequentes e no feedback sobre desempenhos, para que se comece a ver uma mudança significativa nas chefias.
Este pode ser o momento certo para uma transição na liderança das organizações. Para que haja espaço para novos e melhores líderes. Na Nova School of Business & Economics, construímos um Mestrado Executivo em Liderança, do qual sou Coordenadora Académica, em conjunto com o meu colega Pedro Neves, que tem como objetivo abanar mitos e ideias à volta do papel do líder, para clarificar e desmontar a diferença entre liderar e gerir. Neste programa para executivos, propomo-nos a falar sobre gestão de pessoas, não necessariamente de práticas de gestão de recursos humanos, porque devem ser os responsáveis que estão com as suas equipas diariamente a conseguir identificar e gerir talento, motivação, desempenho e cultura.
Este texto trata-se de uma republicação de um artigo publicado na Executive Digest - leia o original aqui.