construção de cenários de procura é mais complexa sem considerar o histórico e é necessário refletir sobre os fatores que poderão dar, a curto prazo, mais confiança aos futuros turistas. A prioridade será a segurança sanitária, não apenas ao nível do índice de infetados e vacinados, mas também dos cuidados de higiene nos aeroportos, aviões, alojamento e atrações turísticas, e capacidade de resposta das entidades de saúde de cada região. O cartão europeu de saúde poderá ser um bom veículo, mas contará mais a qualidade e a atenção ao paciente turista. Por experiência própria de viajante, posso dar o exemplo que o serviço de saúde ao turista numa pequena localidade algures na Islândia pode ser melhor do que numa estância balnear na Grécia. Pelo que é cada vez mais crucial divulgar de forma simples e direta ao turista quais as estruturas e serviços de saúde existentes e preparadas para os receber, numa coordenação entre o privado e o público.
Todas estas dúvidas vão trazer uma retoma mais lenta e desigual conforme o posicionamento no mercado. O alojamento turístico com unidades individuais, mais pequeno e num contexto natureza, posicionado e dirigido aos segmentos mais jovens e de famílias, terá eventualmente uma recuperação mais rápida, e o mais tradicional, de cidade, de grande dimensão e dependente de grandes grupos de lazer e MICE, talvez uma retoma mais lenta. A existência de espaços ao ar livre será considerada uma vantagem e resultará numa primeira escolha.
São muitas as previsões que agora surgem de consultoras e instituições. O CEO da MMGY Global, que no seu artigo de Dezembro de 2020 “ Travel in 2021 will be better and worse than you think” faz uma previsão bastante otimista e muito completa quanto ao comportamento do consumidor, mas alerta que os turistas têm também, cada vez mais, uma atitude ideológica: 32% dos viajantes americanos consideram as práticas sociais e ambientais como fator importante na sua escolha de viagem.
Para além do desafio de construir cenários de previsões do comportamento do mercado e alinhar as respetivas ações nas vendas e na comunicação digital, estamos também perante uma insurreição tecnológica que começa a revolucionar as operações.
Durante a pandemia e consequente crise económica tornou-se necessário rever processos, identificar ao pormenor todos os custos inerentes e refletir sobre novas formas de eficiência na utilização das matérias-primas, incluindo epis e produtividade dos recursos humanos. O distanciamento social e a necessidade de cumprir com todas as regras de higiene e segurança motivaram o investimento na digitização dos processos operacionais e de relação com o cliente (digitização e não digitalização porque ainda não estamos a digitalizar uma dormida e uma experiência no restaurante, ao contrário de um evento e uma reunião). Um efeito positivo desta imposição digital é de já não ser necessário “educar” o cliente e o colaborador para a necessidade de usarem estas ferramentas tecnológicas.
No entanto, é crucial reter que a tecnologia é apenas um meio, pelo que se deve medir o retorno deste investimento digital no benefício e valor que trará para o cliente e na consequente performance na sustentabilidade económica, social e ambiental do negócio.
A questão que se coloca é sobre qual será o embate que esta introdução tecnológica terá nas funções e tarefas das equipas dos alojamentos turísticos. Será eventualmente relevante equacionar e preparar as equipas para as duas hipóteses, a de uma substituição entre homem e máquina, e a de uma transformação da função. Se procurarmos uma alteração das funções das equipas, surge a questão sobre qual o novo perfil pretendido e sobre como se vai formar e mobilizar internamente os atuais colaboradores para estas introduções do digital no dia-a-dia: seja na comunicação digital com os clientes via chat, na definição de novas práticas de upselling e crosseling no digital, ou na gestão e atualização do conteúdo digital focado nas necessidades de cada cliente in-house.
Por fim, temos o grande desafio semelhante às das restantes indústrias: Como potenciar os nossos e os outros dados disponíveis digitalmente em relação ao perfil e comportamento dos nossos atuais e potenciais clientes? Como transformar esses dados em informação simples em tempo real, que seja fácil e rapidamente utilizada pelas equipas das operações na relação com o cliente? E, de repente, o que se pode esperar do 5G que está a caminho?
Este contexto exigente e de incerteza é um momento crucial para refletir, delinear e começar a preparar a implementação de um plano estratégico futuro que potencie as novas ferramentas e metodologias digitais disponíveis. É essencial compreender a importância dos dados e da informação para a tomada de decisão, e estruturar as organizações para a cultura da inovação porque se está num período de semi-retoma a curto prazo com elevada expetativa para uma retoma completa a médio prazo.
Pessoalmente, estou ansiosa por regressar a viajar neste período de transição e por comemorar esta primeira viagem! Assumo que será também o caso dos nossos clientes!
Artigo publicado originalmente na revista Publituris Hotelaria