A maior reforma do sistema bancário na última década está em curso e vai durar pelo menos até ao final de 2024. Ao contrário da agitada reestruturação causada pela crise do subprime de 2008, esta será silenciosa. Mas igualmente impactante.

A partir deste ano, os bancos serão sujeitos à maior transformação interna desde a crise financeira de 2007-2008. A regulamentação europeia obriga-os a que se tornem um dos principais vetores da descarbonização da economia europeia. As instituições bancárias estarão no centro de um sistema de incentivos financeiros de larga-escala que afetará o bolso dos consumidores e o custo de capital das empresas caso não adotem práticas de sustentabilidade.

Já tentamos de tudo para que as pessoas e as empresas se tornem mais sustentáveis. Avisos alarmistas. Ciência quantitativa. Um número ilimitado de cimeiras. Mas a maioria continua a olhar para a sustentabilidade com lirismo, desconfiança ou sem sentido de urgência. Faltam incentivos, sobretudo. Estudos estatísticos indicam que o tipo de incentivo mais eficaz não é social (reputação, reconhecimento), informacional (acesso a novos dados, conhecimentos ou experiências), emocional (atos generosos que gerem um impacto positivo para terceiros) ou relativo ao prazer físico – mas material. Se receber um incentivo financeiro, um ser humano é um aspirante à genialidade. Nos EUA, 77% das empresas empregam algum tipo de incentivo material. Precisamos de estímulos para estudar mais, trabalhar melhor, consumir mais energia renovável, alimentarmo-nos de forma mais saudável. Sem incentivos, somos manifestações do lugar-comum voltados para o entorpecimento e a egolatria.

E os incentivos materiais para a sustentabilidade estão finalmente a chegar. De cima para baixo. A regulamentação europeia, apresentada em 2020, obriga as instituições bancárias a integrarem indicadores ESG e riscos climáticos nas suas estratégias, balanços e práticas até ao fim de 2024. Instrumentos quantitativos (como o Green Asset Ratio e o Banking book Taxonomy Alignment Ratio) permitirão que seja contabilizado o volume de empréstimos verdes. Os bancos traçarão e quantificarão o perfil de sustentabilidade de todos os projetos, empresas e indivíduos que apoiam financeiramente. Cada um deles receberá uma nota ESG. Banca comercial, banca privada, banca de investimentos, e gestão de ativos aceleram agora o passo para que as suas metodologias de identificação de risco e de precificação de valor integrem a nova dimensão da sustentabilidade. Todas as atividades de um banco passarão por filtros de sustentabilidade.

Mas como funcionará o sistema de incentivos financeiros? Primeiro, serão os bancos a serem estimulados materialmente a abraçarem a sustentabilidade. Os seus requisitos de capital poderão variar de acordo com a intensidade carbónica da sua carteira de financiamento. As condições dos empréstimos do BCE poderão ser moldadas pelo desempenho em sustentabilidade dos bancos. Ser verde, compensará financeiramente.

Para se poderem beneficiar, os bancos terão que incentivar toda a sua rede de clientes a adotar prática de sustentabilidade. Premiarão os mais desenvoltos do ponto de vista ambiental e penalizarão os os clientes com negócios poluentes ou más práticas sociais e de governança. Haverá variações no pricing do crédito (spread). Empresas que não adotarem práticas de sustentabilidade serão penalizadas financeiramente. Há todo um novo mercado verde que germinará por pressão dos bancos.

O BCE já deixou claro que não haverá exceções e que as regras têm de ser aplicadas por todos. Em 2022 realizou o seu primeiro teste de resistência bancária para avaliar a exposição do setor financeiro a riscos ambientais. Os resultados não foram animadores. Há alguns meses atrás, publicou também os resultados de outra avaliação aos bancos europeus em que concluiu que 96% deles ainda não são capazes de cumprir todas as obrigações legais neste domínio.

Os bancos portugueses têm começado a corrigir processos internos. Os que são detidos por matrizes estrangeiras estão mais avançados, mas sente-se uma pronunciada falta de formação técnica no campo da sustentabilidade. Quem avisa é a CMVM: “Quer sejam os consumidores de produtos e serviços financeiros, quer sejam as entidades financeiras que disponibilizam produtos e serviços financeiros sustentáveis, existe evidência de lacunas no conhecimento e na operacionalização dos elementos ESG nas decisões financeiras.”

Acima de tudo, falta às instituições bancárias portugueses perceberem as vantagens materiais desta transição. O estímulo não tem de ser apenas moralista ou legalista.

Empresas mais sustentáveis são geralmente empresas mais lucrativas e com menor probabilidade de incumprimento no pagamento de dívida. Ao apoiarem a transformação verde da economia por intermédio da alocação de recursos dedicados às empresas, os bancos não contribuem apenas para a mitigação das alterações climáticas. Dão também um passo para melhorarem o seu próprio desempenho financeiro. É um bom incentivo.

Este artigo de opinião foi publicado originalmente no Expresso. Leia o texto original aqui.

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Publicado em 
28/2/2023
 na área de 
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