Mas, se esta multiplicidade de vozes diferentes e por vezes dissonantes é tão positiva para as empresas, eis a pergunta que se impõe:
Porque há tantas mulheres nas organizações, mas poucas ocupam cargos de liderança?
A resposta a esta questão não é simples, nem linear. A verdade é que existem vários fatores que podem minar a possibilidade de existirem mais mulheres a liderarem equipas e empresas.
Em primeiro lugar, a mais óbvia: o equilíbrio entre a vida profissional e familiar. O contexto de vida das mulheres nas sociedades, especialmente nas latinas, onde ainda existe um papel feminino muito relevante na estrutura familiar, pode prejudicar uma possível ascensão na carreira – e não estou apenas a referir-me às questões da maternidade, falo também de toda a dinâmica doméstica. Há estudos que apontam que, em média, as mulheres trabalham mais três ou quatro horas do que os homens, se tivermos em consideração as tarefas no domicílio. Ou seja, depois de um turno completo de trabalho, muitas mulheres têm o “part-time” da lida da casa. Além disto, a harmonia entre a vida profissional e pessoal é gerida, muitas vezes, de forma diferente por homens e mulheres, sendo que as últimas acabam por abrir mão ou comprometer a carreira profissional para sustentar este equilíbrio.
Por outro lado, há um peso histórico na construção de muitas organizações, que ainda têm na sua base uma cultura mais competitiva, mais viril, mais masculina, alimentando muitas vezes a competição interna, entre colaboradores. As mulheres estão mais predispostas a apostar em ambientais mais colaborativos, por vezes na “cooperação” (estudos comprovam que os homens tendem a ter, no seu sistema de crenças, um outlook mais positivo em relação aos resultados da competição no local de trabalho).
Por fim, não é segredo que, muito por questões histórico-sociais, os homens têm maior facilidade e competências mais desenvolvidas para a construção de redes de networking, tendo mais à vontade para ir “tomar o cafezinho” ou jantar com stakeholders relevantes, alimentando uma rede social mais ativa. Desta forma, acabam também por ser mais lembrados na altura de fazer escolhas para cargos de liderança, por vezes apenas porque estão “mais presentes”.
Uma jornada de empoderamento em quatro dimensões
Na Nova SBE Executive Education, desenvolvemos dois programas focados nestas questões, especialmente dedicados a mulheres: o Women’s Leadership Program e o Programa Promova, desenvolvido em parceria com a CIP – Confederação Empresarial de Portugal. Neste último, falamos de uma jornada de crescimento em quatro dimensões, que pode ser interessante explorar para garantir esta progressão feminina nas organizações:
1. Propósito
É fundamental encontrarmos um propósito para o nosso trabalho e a nossa vida. Nesta fase, o importante é apostar no autoconhecimento - definirmos quem somos, para onde vamos, qual o nosso sonho, a nossa aspiração e o caminho que temos de percorrer para atingir esses objetivos. Esta capacidade projetiva em relação ao futuro é essencial para guiar a nossa jornada no mundo do trabalho.
Depois, é importante sintetizar todas estas descobertas e aspirações numa marca pessoal, capaz de ser anunciada e comunicada ao mercado de trabalho, para que outros possam também saber quem somos, aquilo em que acreditamos e que tipo de lideranças desenvolveremos.
2. Transformação
Depois de fazer o “zoom in”, sobre o nosso conhecimento individual e as nossas aspirações, é preciso fazer um “zoom out” e olhar para o exterior. Esta fase, a da transformação, tem tudo a ver com o contexto, nas suas diversas dimensões, desde a macroeconomia, até à geopolítica, questões que se prendem com a globalização, até à dimensão dos vários interesses dos diversos stakeholders, que muitas vezes são difíceis ou impossíveis de controlar. Contudo, para fazermos uma verdadeira transformação nas nossas carreiras e das nossas organizações, é preciso fazer um mapeamento constante destas variáveis para, posteriormente, conseguirmos produzir um verdadeiro impacto nos negócios.
3. Impacto nos negócios
Nesta terceira dimensão, é importante que haja uma consciência e uma clareza sobre tudo o que acontece a partir de uma rede de relacionamento com os diversos stakeholders, e no fundo, com a governança das nossas empresas. Depois, é preciso traduzir estes insights em estratégias e resultados.
Quer isto dizer que nos cabe a nós colocarmo-nos à disposição da trajetória da organização para atingirmos os resultados que estão traçados, enquadrando-os com o nosso propósito e o contexto externo. No entanto, para atingirmos este fim, é necessário que as nossas empresas sejam sustentáveis, capazes de transformar e de inovar, e para tal, é preciso apostar nas pessoas que fazem parte da organização.
4. Desenvolver pessoas
Esta quarta dimensão tem a ver com a capacidade de desenvolver outras pessoas, enquanto líder. É preciso percebermos que os objetivos que uma liderança traça só são passíveis de serem alcançados através dos colaboradores. Por esta razão, o líder tem de ser capaz de criar uma boa equipa, alimentando a sua pool de talentos, desenvolvendo, nutrindo-a e cuidando dela, para que todos se sintam totalmente ativos, produtivos e empoderados.
Só através do empoderamento dos colaboradores e deste lado mais humano é que as empresas, na realidade, conseguem entregar os resultados pretendidos.
Em síntese:
Para sustentar uma forte liderança feminina, é crucial: ter um grande conhecimento de si própria e da marca que se quer deixar; ter clareza sobre o contexto externo, que traz consigo variáveis difíceis de compreender e incorporar nas estratégias organizacionais, mas que têm de ser mapeadas; fazer com que a organização caminhe para um desafio estratégico alinhado com o nosso propósito e com o mundo; e, por fim, nutrir uma equipa que se sinta empoderada e fortalecida para fazer a organização acontecer.