rené Brown, professora e investigadora na Graduate College of Social Work da Universidade de Houston, no livro "Daring Greatly" (2012) define vulnerabilidade como incerteza, risco e exposição emocional. A investigação que realizou conclui que aceitar a vulnerabilidade, em nós e nos outros, nos torna mais criativos. Conecta-nos com a paixão e sentido de propósito, tornando-nos paradoxalmente mais fortes, com mais recursos para lidar com a adversidade e capazes de gerar soluções.
No livro "Rising Strong" (2015), Brown considera a vulnerabilidade não uma fraqueza, mas um grande sinal de coragem. Foi esta coragem de dizer a verdade que exigimos aos governantes quando fomos para casa e ficámos confinados. Não queríamos a pílula dourada, queríamos a verdade, por dura que fosse. Assumiu-se a vulnerabilidade de haver recursos escassos no SNS e logo apareceram empresas privadas a produzir e oferecer viseiras, máscaras, álcool gel aos que estavam na linha da frente. Apareceram os primeiros ventiladores produzidos em Portugal.
Assumir a vulnerabilidade não é desistir. É o contrário. É abrir a porta a soluções. Em coaching, quanto maior a coragem de assumir vulnerabilidades, maior a transformação que ocorre. Esse encontro com a verdade, gera a energia transformadora e criativa que produz respostas e soluções que antes não existiam.
A par das ameaças reais na sequência da pandemia: desde o risco de infeção aos sérios impactos sócio-económicos, emergem também respostas criativas. A pandemia coloca todas as organizações, todos os líderes e respetivas equipas, numa zona de imensa vulnerabilidade. A energia gerada pelas emoções e a oportunidade de tomada de consciência é imensa. Que não se perca a oportunidade de evoluir para um qualquer nível mais elevado de consciência e propósito, por falta de visão, por medo ou perda de contacto com a inteligência mais subtil e verdadeira.
A jornada do herói, arquétipo coletivo referido por Joseph Campbell - autor americano conhecido pelo seu trabalho em mitologia comparada - na obra "A Thousand Faces Hero" (1949), tem sido amplamente utilizado no cinema e na literatura. Este arquétipo corresponde à ideia de uma pessoa normal que se torna num herói (que existe dentro de cada um de nós) pela forma como supera testes e provações de vida, ascendendo a níveis mais avançados de sabedoria. Esta possibilidade de transformação inerente às grandes provações, está latente no inconsciente coletivo e emerge de forma espontânea, como está a acontecer no caso dos profissionais da linha da frente, cujo mérito os elevou ao estatuto de heróis.
Para poder contactar com o herói que há em si, não deixo recomendações nem respostas. Convido a uma reflexão baseada em perguntas que tornam conscientes e ativam as transformações que está já preparado para fazer:
- Que sinais estou a captar sobre mudanças emergentes que irão alterar a realidade tal como a conheço?
- O que me assusta nessa mudança, que me possa estar a impedir de construir respostas ajustadas? É possível para mim parquear por uns instantes esses receios e dar-me permissão para explorar as novas possibilidades que existem em qualquer mudança?
- Se essas mudanças emergentes trouxessem novas oportunidades, que oportunidades seriam essas? Em que é que me inspiram no meu propósito de vida? Se decidisse focar-me nessas oportunidades, o que faria? Que resultados significativos e gratificantes poderia alcançar?
- Voltando agora aos receios, que riscos reais enfrento? Que opções de mitigação desses riscos consigo identificar? De que recursos disponho que podem ajudar nessa mitigação?
- Se pudesse escolher apenas uma opção, focaria a minha energia e atenção na gestão de riscos ou na criação de oportunidades? E se fosse possível fazer ambas as coisas, qual a distribuição certa para mim: ? % na gestão de risco e ? % a investir na criação de oportunidades?
- Com esta reflexão, que escolhas percebi que posso fazer? O que está ao meu alcance e depende de mim? Qual o mais pequeno passo que posso dar já?
Esta fase há-de passar, mas como diz Yuval Noah Harari, professor na Universidade Hebraica de Israel e autor de "21 Lessons for the 21st Century" (2018), no artigo do Financial Times, de 20 de Março, "The World After Coronavirus": "this storm will pass. But the choices we make now could change our lives for years to come".