Para quem opera, muitas vezes, com o objetivo de sobreviver até ao final do mês ou do ano, os temas da sustentabilidade são vistos como algo dispensável ou dispendioso. Mas a regulamentação europeia e novas forças de mercado irão obrigar-vos a tornarem-se sustentáveis num curtíssimo espaço de tempo. São pelos oito as fontes de pressão:
Vende os seus produtos e serviços para outras empresas de maior porte?
Em janeiro de 2023 entrou em vigor a Diretiva de Reporte de Sustentabilidade Corporativa (CSRD), que obriga as maiores empresas europeias (cerca de 50 mil) a reportarem o seu trabalho em sustentabilidade. O que é que isto tem a ver com as PMEs? Pela força da lei, estas grandes empresas têm de mapear o trabalho de sustentabilidade realizado pelas suas cadeias de valores, compostas maioritariamente por PMEs. Empresas como a EDP, Jerónimo Martins ou Galp, por exemplo, têm, cada uma, dezenas de milhares fornecedores. Todos eles terão de medir e reportar dezenas de indicadores de sustentabilidade como a pegada carbónica ou o consumo de água. As pequenas empresas que não o fizeram deixarão de ter condições para continuarem a vender os seus produtos para grandes compradores.
Vende os seus produtos e serviços para clientes finais?
Mensalmente, um novo estudo de uma consultora ou organização internacional reforça que, após a COVID-19, os consumidores têm optado por estilos de vida mais saudáveis e ecológicos e por produtos ou serviços sustentáveis. Se, até há uns anos, estes produtos eram vistos como um luxo inacessível à classe média portuguesa, atualmente são cada vez mais solicitados por consumidores, fomentando economias de escala que permitem a redução do preço final.
Vende os seus produtos e serviços para entidades públicas?
A legislação nacional, nomeadamente o Código dos Contratos Públicos ou a Lei de Bases do Clima, incentiva a inclusão de princípios de neutralidade climática nas compras públicas e nos cadernos de encargos. Gradualmente, o Estado deixará de ser comprador de produtos ou serviços não sustentáveis.
Procura crédito bancário?
O Banco Central Europeu e a Autoridade Bancária Europeia têm lançado um conjunto de regulamentações e instrumentos (como o BTAR e o GAR) que obrigam os bancos europeus a medirem o volume de empréstimos alinhados com princípios de sustentabilidade. Interessa financeiramente aos bancos emprestar capital verde para poderem, eles próprios, terem acesso a capital mais barato. Serão, por isso, os bancos a imporem aos seus clientes, incluindo PMEs, a adoção de práticas de sustentabilidade.
Tem acionistas e investidores? É cada vez mais comum os investidores coletarem dados ESG (ambientais, sociais e de governança) das suas empresas investidas para poderem ter uma compreensão mais precisa do perfil de risco e oportunidade dos ativos do seu portefólio. Fá-lo-ão também para poderem cumprir a legislação europeia em vigor, como o Regulamento de Divulgação de Finanças Sustentáveis (SFDR), que os obriga investidores a reportarem os impactos positivos e negativos dos seus investimentos para a sociedade e o meio ambiente.
É uma PME com acesso a fundos europeus?
Com o objetivo de atingir a neutralidade carbónica em 2050, a Comissão Europeia tem injetado princípios e práticas de sustentabilidade na sua relação financeira com os estados-membros. Para ter acesso a apoios financeiros europeus, as PMEs portugueses terão de demonstrar que estão alinhadas com o Pacto Ecológico Europeu. Por exemplo, o formulário de candidatura ao Fundo PME 2023, que visa proteger os direitos de propriedade intelectual das PMEs europeias, indica explicitamente que as empresas “envolvidas na transição ecológica” terão “apoio reforçado.”
Faz a sua contabilidade usando normas internacionais de contabilidade (IFRS) emitidas pelo International Accounting Standards Board (IASB)?
Como empresa europeia, a sua resposta é necessariamente afirmativa. A mesma organização irá lançar a 1 de janeiro de 2024 um standard global de reporte de sustentabilidade, alinhado com as normas internacionais de contabilidade. Os departamentos financeiros das grandes empresas e os contabilistas das PMEs terão de tornar-se especialistas em sustentabilidade. Esta transição – de contabilistas puros para consultores – representará a maior mudança neste ofício desde a automação da contabilidade na década de 1950.
Vende produtos com rótulos?
Nos próximos anos a maioria dos rótulos – de roupa a alimentos – incluirá indicadores climáticos e sociais, como pegada carbónica ou taxa de reciclagem. As PMEs que se ausentaram de práticas de sustentabilidade sentir-se-ão expostas publicamente. Dezenas de marcas globais já disponibilizam rótulos com códigos QR que rastreiam produtos da matéria-prima ao consumo final.
Muitas PMEs concluirão que a sua sobrevivência depende da sua capacidade de se tornarem mais sustentáveis. Ciente disso, o Turismo de Portugal lançou recentemente um programa (Empresas Turismo 360°) com uma ferramenta (Forest) que permite às empresas, a maioria delas PMEs, identificarem e reportarem o seu trabalho em sustentabilidade. É uma ferramenta de transformação. A sustentabilidade é um desafio, mas também uma oportunidade. As empresas que se transformam tornando-se mais sustentáveis têm melhores índices de produtividade, competitividade e lucratividade. A sustentabilidade não tem de ser guiada por princípios deontológicos, moralistas, legalistas ou de relações públicas. Tem viabilidade financeira, comercial e económica. Por isso é que é lecionada e investigada em escolas de gestão e de finanças.
Este artigo trata-se de uma republicação de um texto partilhado no Expresso - veja o original aqui.