turismo cresceu de forma praticamente ininterrupta desde meados do século passado, impulsionado pelos desenvolvimentos tecnológicos que permitiram baixar de forma significativa os custos de transporte e criar instrumentos que aproximaram a oferta e a procura de viagens, permitindo que, mais do que uma atividade económica, o turismo se afirmasse como um bem de consumo com importância crescente e mesmo um valor da sociedade em que vivemos.
Ao impactar de forma sensível os movimentos das pessoas, a pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2 atingiu marcadamente alguns setores de atividade económica, acabando por quase paralisar a atividade turística a nível global, conduzindo a uma redução de cerca de 75% das viagens internacionais, fazendo o setor recuar 30 anos, representando uma perda de 1,3 biliões de dólares de exportações e colocando em risco mais de 100 milhões de postos de trabalho diretos no setor.
Olhando para os últimos 20 anos, o setor do turismo foi afetado por crises económicas e sociais importantes. A emergência de fenómenos terroristas, iniciada com o 11 de setembro de 2001 e com sequelas em zonas turísticas um pouco por todo o mundo, crises sanitárias como a SARS 2003 ou a crise económico-financeira de 2008/2009 constituíram importantes desafios ao crescimento do setor, mas do qual o mesmo se recuperou rapidamente.
A Covid-19 teve, contudo, um impacto mais expressivo, diria mesmo esmagador, com uma quebra da procura 11 vezes superior à crise de 2008/9, na medida em que afetou dois dos elementos fundamentais para a dinâmica do setor do turismo - a confiança dos consumidores e a liberdade de movimentação das pessoas.
A incerteza é, hoje, um desafio permanente para os agentes do setor do turismo. Incerteza quanto ao início da recuperação do setor, quanto ao tempo necessário para restabelecer os níveis pré-pandemia e quanto às transformações estruturais que esta crise sanitária produzirá nas preferências da procura, bem como os impactos económicos que lhe estão associados.
Na verdade, o ambiente em que destinos e empresas turísticas tomam hoje as suas decisões estratégicas não tem paralelo com outro momento da história recente, apenas sendo porventura comparável à Segunda Grande Guerra, em que, como agora, o mundo se debatia com outros desafios de maior magnitude.
A pandemia Covid-19 funcionou como acelerador dos processos de transformação que estavam na agenda de qualquer empresário do setor como o próximo desafio a endereçar.
De um momento para o outro, a utilização de tecnologia passou a ser indispensável na relação e no contacto com o cliente e mesmo na prestação do próprio serviço, enquanto condições necessárias para que o negócio se pudesse desenvolver. Rapidamente, assistentes virtuais, menus digitais e outras formas de contacto com o cliente se tornaram prática corrente na generalidade dos negócios turísticos.
Por outro lado, o comportamento do consumidor alterou-se, por via das restrições que lhe foram impostas, mas também pela alteração dos seus padrões de comportamento. A alteração das relações laborais e a emergência do teletrabalho eram descritos há muito tempo por organizações como o Fórum Económico Mundial como fatores com potencial de alterar hábitos e preferências do consumidor. Com a Covid-19, essa possibilidade foi testada e em muitos casos com sucesso, podendo acelerar o processo de adoção permanente de novas metodologias de trabalho, geradoras de novas formas de relação dos indivíduos com o seu emprego, com o seu ambiente habitual e com a sua forma de experienciar o tempo livre, encerrando oportunidades para a diversificação de serviços por parte das empresas do turismo.
Por fim, esta será porventura a primeira crise com impacto económico em que a sustentabilidade não saiu da agenda, um sinal relevador de que as preocupações ambientais são relevantes para a sociedade em que vivemos e que produtores e consumidores terão de incorporar esses princípios e práticas nos modos de produção e no comportamento de consumo.
Este cenário de disrupção contínua traz consigo desafios importantes para os líderes e para as suas equipas.
Em primeiro lugar, a imperatividade da transformação digital, integrando a tecnologia em todos os aspetos da vida da empresa, ajustando os seus modelos de negócio, transformando os seus processos internos e melhorando a sua relação com o cliente. De acordo com o INE, em 2020, apenas 46,9% das empresas do setor do alojamento e restauração em Portugal tinham website, o que ilustra o caminho tremendo a percorrer no processo de digitalização que vai muito para além disso.
Por outro lado, num contexto de redução abrupta do tempo de tomada de decisão, a capacidade de utilizar de forma eficiente os dados na gestão e na criação de valor será um fator de competitividade poderoso, de que as empresas não poderão prescindir no futuro próximo.
Finalmente, a importância da inovação como prática fundamental que forneça às organizações a capacidade e a agilidade para introduzir novos produtos e serviços num ambiente de constante mutação, melhorando a experiência dos seus clientes, gerindo de forma mais eficiente os seus recursos e maximizando os resultados operacionais, gerando desta forma maior valor para a sociedade.
Artigo publicado originalmente na revista Publituris Hotelaria